Em CPI das Bets, Virgínia Fonseca finge ter 12 anos. E senadores também

Gabriela Biló/Folhapress
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Virgínia Fonseca chegou à CPI das Bets nesta terça-feira (13) com uma missão: convencer os senadores da comissão de que tinha apenas 12 anos. Conseguiu. Ela tem 26.

Com 53 milhões de seguidores só no Instagram (e um volume oito vezes maior de fortuna estimada em reais), a maior influencer do Brasil virou alvo (e atração) por supostamente ganhar dinheiro com a desgraça alheia. Ela é suspeita de assinar um contrato que previa uma taxa extra de remuneração sobre perdas de apostadores.

Assunto sério, portanto, em um país de endividados.

Tão sério que ela chegou à sessão com um habeas corpus debaixo do moletom preto, concedido pelo ministro Gilmar Mendes, do STF. A medida dava a ela o direito de ficar em silêncio e não se incriminar. (Campeão de A Fazenda, Rico Melquíades, outro garoto-propaganda sob suspeita, obteve liminar análoga antes de seu depoimento).

Diante dos senadores, a estratégia era clara: fingir que não tinha ideia do que estava fazendo ali. Nem da gravidade das acusações.

Para isso, foi vestida como uma garota que acaba de acordar e foi emburrada fazer a prova na escola —de óculos, moletom, cabelo solto e um copo Stanley rosa (não se sabe se lotado de Toddynho, água ou vento).

Os senadores, por sua vez, tinham, ou deveriam ter, outra missão: mostrar que de pacóvia a depoente não tinha nada.
Bem. Meia hora depois, dava até para dizer que ela ganhou a briga. Mas a briga não aconteceu.

Diante dos parlamentares, ela foi tão tietada que não faltou sequer ser interrompida para fazer selfie com um fã. Para quem achava que já tinha visto de tudo em uma CPI, o check list andou um pouco.

De olho nos seguidores da influencer, a maioria dos parlamentares não estava preocupada em esclarecer nenhuma suspeita durante a sessão. Queriam piscar para futuros eleitores. E trataram a jovem menina rica como uma adolescente que ainda não sabe que precisa escovar os dentes antes de dormir.

Foi o que fez o senador Cleitinho (PL-MG) ao condenar o pecado, e não a pecadora. E depois pedir um vídeo, no meio da sessão, para enviar um beijo da depoente famosa para a esposa.

Pior fez Jorge Kajuru (PSB-GO), que pediu a palavra para fazer um testemunho em defesa de Virgínia (um “talento”, um “fenômeno”), do sogro dela, o cantor Leonardo, da dura vida de senador e das próprias bets que deveria investigar.

Senador por Goiás, Kajuru pode até rasgar dinheiro —como o próprio afirmou—, mas não é louco a ponto de arrumar encrenca com duas das maiores instituições do estado que lhe garantiu oito anos de mandato (três, se contar o marido da influencer, o cantor Zé Felipe —presente na sessão e igualmente tietado pelos presentes).

“Não podemos questionar uma pessoa da integridade da Virgínia. Não é dona de bets. Se for, abandono meu mandato e faço voto de pobreza!”, disse Kajuru.

Pelo testemunho, ele ganhou um convite para morar na casa dela. E um “merchan” em forma de agradecimento nos stories —este, dividido com Cleitinho, por quem a garota-propaganda disse ter saído apaixonada e a quem qualificou como alguém com o dom de trazer a paz e que precisa ser estudado pela Nasa.

Quem esperava circo acabou dançando em palanque.

Antes do depoimento, Virgínia postou normalmente a rotina, como se nada estivesse acontecendo. Saiu de lá dizendo-se grata aos novos amigos da CPI. E aproveitou o buzz para anunciar uma mega promoção de sua grife —não de jogos, ao menos.

Acostumados a consertar relógio com luva de boxe, até os parlamentares mais experientes tiveram dificuldade de saber se a influencer diante deles não sabia mesmo o significado da palavra “mitigar”, como ela deu a entender a certa altura, ou se incorporou a personagem a tal ponto que entregou em branco a prova de língua portuguesa.

A única ali que parecia não cair na graça era a relatora da comissão, Soraya Thronicke (Podemos-MS), que em certo momento lançou o método socrático para questionar: ora, se a fortuna da influencer não vem das apostas, por que, então, fazer propagandas de apostas?

Virgínia acusou a sinapse e disse que ia pensar no caso assim que chegasse em casa.

A lição de casa não é ela que precisa entregar.

UOL