O padre Fábio de Melo foi confirmado pela Arquidiocese de Natal como uma das atrações da festa dos mártires de Cunhaú e Uruaçu. O show dele vai acontecer em 3 de outubro, feriado estadual em homenagem aos mártires, às 16h, no Santuário dos Mártires, em Uruaçu.
Além da confirmação do show, a Arquidiocese de Natal também divulgou a programação da festa dos Santos Mártires, que começa no dia 24 de setembro e segue até o dia 3 na comunidade de Uruaçu, em São Gonçalo do Amarante, onde fica o Santuário dos Mártires.
A abertura é no domingo (24), com com quatro missas: às 5h, às 9h, às 10h30 e às 19h. Nos demais dias, a programação será: 5h a celebração de missa; às 12h, recitação do terço de São Mateus Moreira; das 15h às 17h, acampamento cultural e, às 19h, missa.
3 de outubro
No dia 3 de outubro, dia do feriado, a programação começa às 5h, com a celebração eucarística presidida pelo Padre Alexsandro de Lima Freitas. Às 6h, terá início a 3ª meia maratona e caminhada dos Santos Mártires, saindo do Santuário, em Uruaçu.
Também pela manhã serão realizadas duas caminhadas, sendo uma saindo da Igreja Matriz de Macaíba. e outra da Igreja Matriz de São Gonçalo do Amarante – ambas com destino ao Santuário dos Mártires.
Nesse dia 3 de outubro também ocorrem missas às 7h, às 9h e às 10h no Santuário. Às 14h30, haverá a recitação do Terço da Misericórdia, conduzida pelo Padre Alexsandro Freitas e missionários.
O show do Padre Fábio de Melo acontece às 16h, e, às 18h, haverá uma missa solene, presidida pelo administrador apostólico da Arquidiocese de Natal, Dom Jaime Vieira Rocha.
Quase 9 em cada 10 brasileiros acreditam em Deus ou em um poder superior
Deus está sempre na boca do brasileiro, um povo que vive em um país de maioria cristã onde cultura e fé estão intimamente ligadas – das altas esferas de poder ao cotidiano do cidadão comum – e no qual a vida religiosa muitas vezes preenche lacunas deixadas pelo Estado.
“Vai com Deus.”
“Graças a Deus!”
“Deus me livre.”
“Só Deus sabe…”
Esses são alguns dos fatores que explicam porque o Brasil se destaca quando o assunto é espiritualidade. Quase nove em cada dez brasileiros dizem, por exemplo, acreditar em Deus, segundo a pesquisa Global Religion 2023, produzida pelo instituto Ipsos.
O índice de 89% de crença em um poder superior coloca o Brasil no topo do ranking de 26 países elaborado pelo Ipsos, com base em uma plataforma online de monitoramento que coleta informações sobre o comportamento destas populações.
O Brasil aparece empatado com África do Sul, que teve os mesmos 89%, e Colômbia, com 86% – um empate técnico dada a margem de erro de 3,5 pontos percentuais da pesquisa.
Holanda (40%), Coreia do Sul (33%) e Japão (19%) foram os países onde a população menos crê em Deus ou em um poder superior, de acordo com a pesquisa.
A Global Religion 2023 é baseada em dados coletados entre 20 de janeiro e 3 de fevereiro, com 19.731 entrevistados, aproximadamente mil deles no Brasil. Não há países islâmicos na amostra, embora pessoas que seguem o islamismo tenham sido consultadas.
Entre os países pesquisados, o Brasil ficou 28 pontos percentuais acima da média na crença em Deus, que foi de 61%.
“No cotidiano brasileiro, as pessoas falam em Deus o tempo todo, é algo comum e normal, e é estranho se alguém reage de forma negativa a isso”, diz Ricardo Mariano, sociólogo da Religião e professor da Universidade de São Paulo.
Mariano ressalta que o Brasil costuma se destacar em pesquisas internacionais sobre religiosidade e fé porque a crença em Deus e a espiritualidade estão profundamente intricadas na nossa cultura, mesmo entre quem não tem compromisso com nenhuma religião específica.
De acordo com a pesquisa do Ipsos, 70% dos brasileiros disseram que acreditam em Deus como descrito em escrituras religiosas, como a Bíblia, o Alcorão, a Torá, entre outros, e 19% acreditam em uma força superior, mas não em Deus como descrito em textos religiosos.
Cerca de 5% dos brasileiros disseram não acreditar em Deus ou em um poder maior, 4% afirmaram que não sabem e cerca de 2% preferiram não responder.
“São dados que estão de acordo com nosso histórico de um país onde a religião e a religiosidade têm uma predominância tanto na cultura e na vida cotidiana quanto nas esferas de poder”, diz Helio Gastaldi, diretor de opinião pública da Ipsos no Brasil.
Vida religiosa
Mas acreditar em Deus não significa necessariamente ser religioso – e o caso brasileiro demonstra bem isso. Enquanto 89% dos entrevistados no país disseram crer em Deus ou um poder superior, só 76% afirmaram seguir uma religião. O índice nacional ficou novamente acima da média global, que foi de 67% neste caso, mas bem abaixo dos primeiros colocados: Índia (99%), Tailândia (98%) e Malásia (94)%.
Entre os brasileiros religiosos, 70% disseram ser cristãos (católicos, evangélicos e outras denominações) e 6% são filiados a outras religiões, enquanto 22% disseram não ter uma religião, sendo 16% ateus e 6% agnósticos. Os dados da Ipsos mostram que a diferença na adesão dos jovens da geração Z (de até 23 anos) e do resto da população adulta a uma religião é bem maior entre os católicos do que entre os evangélicos.
Enquanto 38% dos adultos se declararam católicos, somente 23% dos jovens da geração Z dizem aderir à religião – uma diferença de 15 pontos. Já entre os evangélicos e outros cristãos, o índice geral entre adultos é de 29% e entre os jovens é 26% – ou seja, além de existir uma diferença geracional menor, já há mais jovens evangélicos do que católicos no Brasil hoje, aponta o estudo.
O índice dos sem religião na medição da Ipsos ficou bem acima dos 8% registrados pelo último Censo, de 2010, que, por sua vez, detectou um aumento de 0,7 pontos percentuais em relação ao levantamento anterior (7,3%).
“Apesar de sabermos que a proporção de pessoas sem religião no Brasil tem aumentado – dados do Datafolha de 2022 indicam 14% sem religião, dentre população em geral, e 34% sem religião entre os jovens -, o fato da pesquisa da Ipsos ser com painel online pode inflar um pouco este número, supondo que entre os mais pobres esta proporção dos sem religião seja um pouco menor”, diz Gastaldi.
Brasileiros que acreditam em Deus ou em um poder maior somam 89%
O Brasil acompanha, mesmo que timidamente, uma tendência global de aumento do número de pessoas que não tem religião, diz Mariano. “É preciso aguardar os dados do censo 2022, mas tudo aponta que esse número vai ter aumentado”, diz.
Enquanto no Brasil a crença em Deus supera a religiosidade, em países como Índia e Tailândia, que lideram o ranking de religiosos, e também onde a filiação a uma religião é minoritária, como Coreia do Sul (44%) e Japão (40%), a situação se inverte e há mais pessoas religiosas do que aquelas que acreditam em um poder superior. Isso acontece por causa das características particulares da fé nestes locais, segundo especialistas.
Religiões como o budismo e o xintoísmo – que são predominantes em alguns deles – são não teístas, ou seja, não têm um conceito de Deus ou de um poder superior como nas chamadas religiões abraâmicas, como o cristianismo, islamismo e o judaísmo, explica Gastaldi. O xíntoísmo é uma reunião de tradições espirituais japonesas centradas no culto à natureza e aos antepassados. Já o budismo trabalha com a ideia de iluminação espiritual individual
Ao mesmo tempo, explica Mariano, o conceito de Deus não consegue captar bem as crenças de religiões politeístas (com múltiplas divindades) como o hinduísmo, que é majoritário na Índia, e as religiões afro-brasileiras. O Brasil tem, porém, um índice alto de crença em Deus e de religiosidade mesmo se comparado a outros países em desenvolvimento – e isso tem a ver com a história do país.
“A religião é uma força fundamental no Brasil desde a época da colonização dos portugueses. O catolicismo é a religião que nos foi imposta pelos portugueses e vai ter um papel central nas identidades nacionais”, afirma a professora de sociologia da religião Nina Rosas, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Ausência do Estado
Quase 9 em cada 10 brasileiros acreditam em Deus ou em um poder superior – Crédito, Getty Images
Helio Gastaldi, do Ipsos, explica que os dados da pesquisa de 2023 são consistentes com um fenômeno muito estudado. Entre os países laicos, onde a religião é separada do Estado e não há uma religião oficial, a vida religiosa tende a ter maior importância para a população onde o PIB per capita (riqueza de um país em relação à quantidade de habitantes) é menor ou onde há grande índices de desigualdade, aponta Gastaldi.
“São locais onde a religião de certa forma supre a ausência do Estado. Ela traz perspectiva, consolo, às vezes até assistência material – mas também pode ser usada como forma de manipulação e ferramenta do poder”, diz Gastaldi.
Na pesquisa do Ipsos, por exemplo, 90% responderam que acreditar em Deus ou forças superiores ajuda a superar crises, como doenças, conflitos e desastres.
O catolicismo sempre operou no Brasil como uma espécie de extensão do Estado, mesmo depois da proclamação da República, afirma Rosas.
Ao mesmo tempo, havia uma forte perseguição a outras religiões, explica a pesquisadora – o Código Penal de 1890, por exemplo, criminalizava magia, espiritismo e curandeirismo. Havia resquícios disso na legislação até 1985, aponta Rosas.
“Então as religiões mediúnicas, tanto espiritismo quanto as de matriz africana, tiveram que se adaptar a essas pressões tentando se enquadrar em algo que era considerado legítimo”, diz Rosas.
Isso gerou o surgimento de um sincretismo religioso que ultrapassa as barreiras das religiões individuais.
“Apesar da opressão da colonização ter vindo embutida com a religião para o Brasil, na forma da religião imposta, de certa forma o povo soube separar Deus do missionário e ficou com a figura de Deus”, afirma Fernando Altemeyer, professor do departamento de Ciência da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Altemeyer avalia ainda que o alto índice de crença em Deus verificado pela pesquisa do Ipsos também é provavelmente influenciado pelo contexto imediato da vida pós-pandemia no Brasil, que foi especialmente atingido pela covid-19 e onde o governo foi criticado pela falta de resposta adequada ao problema.
“Tivemos mais de 700 mil mortos, foram dois anos de depressão e sofrimento. E sabemos que depois de uma grande crise, as religiosidades e espiritualidades aumentam, têm uma explosão”, diz ele.
“Foi assim no Japão após a Segunda Guerra Mundial, após a bomba atômica, por exemplo.”
A força da fé
Ricardo Mariano, da USP, explica que, historicamente, os movimentos que foram oposição ao poder ou governo do período nunca tiveram um caráter de combater a religião ou espiritualidade. “Nós não temos uma tradição iluminista, de movimentos políticos ideológicos anticlericais e seculares”, afirma ele.
A secularização é o processo de afastamento de uma sociedade da religião. “Mesmo a classe média brasileira não é altamente secularizada”, afirma o pesquisador. Ele aponta que mesmo movimentos de esquerda não fizeram uma oposição à religião em si – o PT, o maior partido de esquerda do país, por exemplo, tem em suas origens o catolicismo da Teologia da Libertação, corrente católica que defende a atuação da Igreja em prol do combate à desigualdade social como prioridade.
No Brasil, movimentos por direitos de grupos que historicamente sofreram opressão religiosa – como mulheres e pessoas LGBT – não tendem a ser antirreligiosos, destaca Mariano. Embora certos movimentos façam oposição à influência de grupos religiosos no Congresso, diz Mariano, raramente a oposição é em relação à ideia de religiosidade em si.
“Mesmo quando a democratização do ensino superior avançou, isso não implicou na absorção de uma cultura que faça oposição à crença religiosa, não houve esse embate”, diz Mariano.
A Comunidade Católica Shalom promoverá, entre os dias 7 e 9 de abril, o Retiro de Semana Santa, no Colégio Marista, que fica no bairro do Tirol, sempre a partir das 8h, com entrada no valor de R$19,90.
O Retiro já é tradicional na capital potiguar e todos participam da preparação para a Páscoa do Senhor, com momentos de oração, formações, confissões e a Via Sacra Artística, tudo para favorecer uma experiência autêntica com o Amor de Deus.
Este ano, o Retiro terá como tema: “Cristo humilhou-se e foi exaltado” (Fl 2,8), e trará diversas reflexões sobre como Jesus ensinou sobre a humildade que agrada a Deus e como Ele nos chama a seguir seus passos no mundo atual, tão necessitado de amor e humildade.
A Semana Santa é o momento de refletir sobre a paixão, morte e ressurreição de Jesus, que redimiu os pecados do mundo inteiro com sua oferta de amor. Aproveitar esses dias em movimento de contrição, reflexão e oração, faz com que tudo tenha um significado muito especial, culminando com o Domingo de Páscoa, onde a Igreja celebra a Ressurreição de Cristo.
Padre João Medeiros Filho
O ato da imposição de cinzas remonta ao Antigo Testamento. O livro de Ester narra Mardoqueu vestindo-se com pano de saco e cobrindo-se de cinzas ao saber do decreto de Assuero (Xerxes I, da Pérsia), condenando à morte os judeus ali residentes (cf. Est 4,1). Atitude semelhante teve Jó, demonstrando o seu arrependimento (Jó 42, 6). Daniel, ao profetizar a tomada de Jerusalém pela Babilônia, escreveu: “Voltei o olhar para o Senhor Deus, procurando fazer preces e súplicas com jejuns, vestido de tecido rústico e coberto de cinzas.” (Dn 9, 3). Após a pregação de Jonas, o povo de Nínive se vestiu de roupas grosseiras, impondo-se cinzas. O rei levantou-se do trono e sentou-se sobre elas (Jn 3, 5-6). Tais exemplos demonstram a prática religiosa de seu uso como símbolo de arrependimento, tristeza, penitência, conversão e dor. Cristo aludiu igualmente a esse costume, quando se dirigiu aos habitantes das cidades de Corazim e Betsaida que não se arrependiam de seus pecados, apesar de terem presenciado milagres e ouvido a Boa Nova. “Se em Tiro e Sidônia tivessem sido realizados os milagres feitos no meio de vós, há muito tempo teriam demonstrado arrependimento, vestindo-se de cilício e cobrindo-se de cinzas”, advertiu o Mestre. (Mt 11, 21).
A Igreja, desde os primórdios, continuou este ritual com um simbolismo análogo. Tertuliano aconselhava o pecador a “vestir-se com um tecido de estopa e cobrir-se de borralho.” Eusébio, primeiro historiador da Igreja, relata que Natálio se apresentou com esses trajes, diante do Papa Zeferino, para suplicar-lhe o perdão.
No cristianismo medieval, quando o penitente saía do confessionário, o sacerdote impunha-lhe cinzas para significar que o “velho homem” tinha sido destruído, dando lugar ao “novo homem” (Ef 4, 24), do qual fala o apóstolo Paulo.
Por volta do século VIII, as pessoas que estavam prestes a morrer, eram deitadas no chão sobre um tecido rude e nelas se jogava pó.
O sacerdote, aspergindo-as com água benta, dizia: “Lembra-te, ó criatura, que és pó e nele te hás de tornar.” (Gn 3, 19). Este rito foi tomando uma nova dimensão espiritual e passou a significar morte ao pecado, em seus diversos aspectos: mentira, orgulho, injustiça, inveja, ódio, violência etc. Assim, com o passar dos anos, tal costume foi associado ao tempo quaresmal. Neste, somos convidados a sepultar o velho homem existente em nós para ressurgir com Cristo, na Páscoa.
Na liturgia atual, as cinzas utilizadas na quarta-feira são obtidas com a queima de sobra das palmas bentas no Domingo de Ramos do ano anterior.
O sacerdote as abençoa e impõe sobre os fiéis, dizendo: “Lembra-te que és pó e nele te hás de tornar”, ou então: “Converte-te e crê no Evangelho.” (Mc 1, 15). Essa cerimônia é um convite à preparação para a Páscoa pela vivência da quaresma, tempo privilegiado para uma revisão de tudo o que nos aniquila em nossa caminhada de fé e amor.
Aceitando tal ritual, expressamos duas realidades fundamentais: a consciência de que somos criaturas efêmeras e nossa fé na ressurreição. Cristo ressuscitou dos mortos, prometendo-nos que também ressuscitaremos.
É conhecida na mitologia grega a força de Fênix, que renasce das cinzas. Isto lembra-nos que delas também nós podemos surgir, como criaturas novas, pela graça inefável de Deus. Elas simbolizam mudança radical, na medida em que representam aniquilamento ou destruição. Por essa razão, somos chamados a nos converter ao Evangelho de Jesus Cristo, mudando nossa maneira de pensar, julgar e agir, libertando-nos da arrogância, do egoísmo e de tudo aquilo que nos afasta de Deus.
A palavra marcante com que se abre a celebração da quaresma – a qual se inicia na quarta-feira, após o carnaval – é conversão. O termo, de origem hebraica, indica mudança interior, dir-se-ia, transformação da mente e do espírito. Foi isto o que Cristo veio trazer com sua mensagem.
Ele indicou ao ser humano um novo caminho e modo de ser e viver.
O apóstolo Paulo, de forma inspirada, o chama de “novo Adão”, qual seja, uma nova humanidade (Rm 5, 12-21).
Quando se estuda Jesus Cristo, nem sempre a figura histórica está em harmonia com a divina. Pesquisadores do período em que ele viveu relutam em acreditar que José tenha se deslocado de Nazaré a Belém para Maria dar à luz a criança. A cidade de Belém, que fica na região hoje chamada de Cisjordânia, a cerca de 160 quilômetros de Nazaré, é a terra natal de Davi, onde ele foi coroado rei dos judeus, e talvez tenha sido incluída no enredo a fim de reforçar a profecia em torno do Salvador. A própria data de nascimento foi arbitrariamente fixada pela Igreja Católica para fazer o Natal prevalecer sobre as festas pagãs de fim de dezembro que marcavam o início do inverno no Hemisfério Norte. Assim, foi com certa incredulidade que a comunidade científica recebeu a notícia de que a casa onde Cristo viveu estaria localizada no subsolo de um convento em Nazaré.
A história do Convento das Irmãs de Nazaré, ao norte de Israel, tem origem tão remota quanto a saga do homem — aqui no sentido histórico — que lançou a mais influente religião do mundo ocidental: o cristianismo e todas as suas vertentes. Para entender o caso, é preciso fazer uma breve viagem no tempo. Quando o Império Romano se esfacelou na Itália no século IV, ele ainda prosperou por um milênio no Oriente. Essa nova Roma — cuja capital era Bizâncio, rebatizada de Constantinopla e finalmente de Istambul, na atual Turquia — já havia se convertido ao cristianismo quando começaram as peregrinações às cidades sagradas de Jerusalém, Belém e outras da região comumente chamada de Terra Santa. Em Nazaré, na passagem do século IV para o V, foi erguida uma igreja bizantina sobre a antiga estrutura de uma casa de pedra e argamassa parcialmente escavada na encosta de um morro. Pelo jeito, não era uma residência qualquer, pois o templo, chamado de Igreja da Nutrição (uma vez que seria o local onde Jesus foi criado), passou a ser ponto recorrente de parada de peregrinos até ser destruído, reconstruído e depois consumido pelo fogo, provavelmente no século XIII.
Quando freiras francesas se instalaram ali, no século XIX, as ruínas estavam praticamente intocadas havia décadas. Elas então escavaram o subsolo em busca de algo que corroborasse a história de que aquela teria sido a casa de Jesus, mas não tinham os recursos financeiros nem científicos para isso. Ainda assim, conseguiram juntar artefatos para montar um pequeno museu. Em 1914, uma igreja austera no estilo franciscano foi erguida sobre a estrutura que teria sido a oficina de José e batizada com o nome dele, mas a maior parte do sítio arqueológico ficou esquecida.
O assunto só voltaria à tona em 2006, com a chegada ao sítio do professor Ken Dark, doutor em arqueologia e história pela Universidade de Cambridge. Buscando encontrar evidências da igreja bizantina perdida, ele recebeu autorização para estudar o local. Dark tem escrito ensaios desde então e lançou um livro neste ano sobre o Convento de Nazaré, ainda sem tradução para o português. O que o arqueólogo postula é que as ruínas no subsolo são do século I. Usada como cava e cripta pelos bizantinos, a habitação foi mantida razoavelmente preservada ao longo dos anos, o que leva a crer que tinha significado para os cristãos. Ela foi solidamente construída por alguém que dominava o ofício. Teria sido José? Dark admite que não tem prova irrefutável e sim um conjunto de evidências que poderiam sustentar a teoria. José era um artesão hábil, definido no Novo Testamento, em grego, como um “tekton”, artífice que tanto poderia ser um carpinteiro como um pedreiro.
A casa é de pedra calcária, material de preferência dos judeus do primeiro século. Outros artefatos de calcário foram encontrados, bem como potes de cozinha quebrados. Como foi parcialmente escavada na pedra, tem um lance de escadas e teria sido avarandada. Uma das entradas foi preservada, assim como parte do chão original de cal. Mosaicos do período bizantino foram instalados ali posteriormente, indício de que os antigos reconheciam que se tratava de um lugar de devoção.
Segundo a crença, o nascimento do Salvador teria sido anunciado pelo Arcanjo Gabriel a Maria em um local perto da casa de José, onde hoje se encontra a Basílica da Anunciação, a poucos metros do convento. As Irmãs de Nazaré trabalham pela comunidade desde que lá se instalaram. Construíram também uma escola e uma hospedaria para peregrinos, abertas a visitação, contanto que previamente agendada.
Como é comum ocorrer em investigações arqueológicas complexas, o trabalho do professor Dark não escapa ileso. O pesquisador René Salm, especialista nas origens da cristandade, afirma que as conclusões do arqueólogo são apenas interpretativas. Salm argumenta que o subsolo do convento teria sido erguido muitos anos depois do período de Cristo e que a construção era tipicamente usada para atividades funerárias e agrícolas, e não como residência. O Jesus histórico, neste caso, não estaria em conflito com o Jesus divino, mas apenas com a arqueologia — uma ciência tão sujeita a erros e acertos quanto os seres humanos que a estudam.
Publicado em VEJA de 23 de dezembro de 2020, edição nº 2718
Sociólogos, historiadores, terapeutas e religiosos advertem para o perigo de uma “civilização de ameaças”. No Brasil, poderes se insurgem uns contra os outros, em mútuas e constantes coerções. Os diversos setores da economia deixam muitos insones. Autoridades sanitárias comentam sobre o eventual colapso da saúde. Governos queixam-se da escassez de recursos para gerir a coisa pública. Pastores de almas preanunciam tempos apocalípticos. Verifica-se a negação do anúncio do cristianismo proclamado pelo anjo, na Noite Santa: “Eis que vos anuncio uma grande alegria.” (Lc 2, 10). A mensagem de Cristo é o aceno de paz e Boa Nova (Evangelho). Outrora, crentes e agnósticos viveram épocas tenebrosas. Não há como esquecer a fogueira da Inquisição e os horrores do holocausto. Houve tempo em que pregadores apontavam a porta do inferno, considerando-se proprietários do céu. Os anos se passaram e ainda se tenta esconder a beleza da doutrina cristã com mantras e adereços ideológicos, ofuscando a ternura cativante do Salvador.
Vive-se numa sociedade ameaçadora. Muitos sentem a dor da angústia e as investidas das ideologias. Estas se servem inescrupulosamente de tudo, máxime da confusão arquitetada pelos profetas do caos. Ao sofrimento físico soma-se o espiritual. Não basta a indignação ética. É necessário solidariedade e compaixão com os outros. O cristianismo é a religião do bom samaritano, na parábola narrada por Lucas (Lc 10, 25-37). “O outro que se assusta e sofre é parte de nós mesmos”, declarou São João Paulo II. Em tempos de medos, precisa-se cultivar a semente da esperança, não obstante tanta aflição. Pairam incertezas, acompanhadas de inquietude e desconforto. Não se pode esquecer que as agruras individuais e a infelicidade coletiva são o preço dos descasos e desigualdades reinantes.
As pessoas vivem tensas, tomadas por constantes sentimentos, notícias e imagens de maus presságios, doença, dor e morte. Isto demonstra que a humanidade vive sob o signo do temor, agravado pela pandemia. O pavor de perder a vida, saúde e emprego, acrescido de palavras atemorizantes, deixa as pessoas confusas e deprimidas. As igrejas têm o dever de confortar e animar o povo, como testemunhara o salmista: “Mesmo se eu tiver de andar por um vale de sombras, não temerei, pois estás comigo.” (Sl 23/22, 4). “E se Deus é por nós, quem será contra nós?” (Rm 8, 31). A Bíblia é pródiga de passagens de alento e encorajamento. Os cristãos devem ser mensageiros da paz, precursores da alegria e da vida.
Atravessa-se o ocaso de uma época. O pôr do sol é belo, justamente por carregar um misto de indefinições e dúvidas. É a “elegante melancolia do crepúsculo”, como lembra Charles Chaplin. Mas, a tristeza – no seu ícone maior da Sexta-feira Santa – traz em seu bojo a potencialidade de transformar a aparente decepção em vida, aurora e luz. Hoje, é preciso pedir com insistência renovada, como os discípulos de Emaús, no entardecer pascal: “Fica conosco, Senhor, pois já é tarde e a noite vem chegando.” (Lc 21, 29). É fundamental que as igrejas relembrem a certeza de que “a luz brilhará na escuridão.” (Jo 1, 5). É compreensível o desânimo que se abate nesse dramático momento brasileiro. Por essa razão, como é bom ouvir as palavras de Jesus: “Estarei convosco todos os dias. Confiança, eu venci o mundo!” (Jo 16, 33).
Nestes tempos difíceis venha a lição dos ipês floridos e a sociedade também possa florescer e frutificar. Oxalá uma nova estação acalme os ânimos exaltados, o radicalismo e o desrespeito aos outros, advindo, frequentemente, do conceito equivocado de liberdade de expressão. A metáfora das craibeiras coloridas ensina aos homens que não é possível antecipar a primavera. No entanto, é factível transformar o “inverno” no despontar (em nós) de um novo ser humano. Ele pode ser belo, fecundo e transformador. Urge arrefecer as emoções e o pessimismo para brotar o amor! O outono dá-nos uma lição: as folhas caem, mas a vida resiste, mesmo em dias sombrios e frios. Saibam todos: Deus cuidará sempre de nós. “Ele é nosso refúgio e seus braços fortes nos sustentam!” (Dt 33, 27).
Cristo, antes de enviar os apóstolos para pregar o Evangelho, fez a seguinte recomendação: “De graça recebestes, de graça deveis dar.” (Mt 10, 8). Eis uma exortação com força interpelativa. A gratuidade é uma virtude essencial, apesar de muitos considerarem desnecessáriaa sua inclusão nos protocolos de providências e sugestões para o mundo de hoje. Tem provocado questionamentos daqueles que calculam valores e resultados,somente a partir de dividendos e lucros. Há os que pensam prioritariamente em ampliar a lista de seus bens e benesses. Reconhecer a importância dessa qualidade humana parece algo distante das instâncias dos poderes, marcadas pela cultura do “toma lá, dá cá”. O agir gratuito geralmente é considerado um tema secundário, quando se pensa em soluções urgentes para a sociedade hodierna. A lógica da atualidade é tirar proveito de tudo. Ninguém faz nada de graça, sem segundas intenções. A ausência de atos generosos e desinteressados dificulta sobremaneira o surgimento de uma nova era para a humanidade.
A crescente disseminação de notícias falsas manifesta os propósitos velados dos indivíduos e grupos.São mentiras elaboradas e propagadas em larga escala para fragilizar instituições, desmoralizar e destruir pessoas, incitar o ódio e, assim, de modo antiético, obter alguma vantagem. Projetos sobre novos tempos a serem vividos pela sociedade – capazes de livrá-la do caos – reservam um ínfimo espaço ao tema da gratuidade. No entanto, ela é determinante. Contém a força recuperadora do altruísmo, que ilumina olhares e fecunda a inteligência, levando a repensar os caminhos da humanidade.
Embora importante, a generosidade vem desaparecendo do cotidiano. Deixou de ser fermento no coração humano. Chega-se ao ponto de pensar que é sinônimo de ingenuidade. Equivocadamente, passa-se a considerar como “virtude” saber manipular ou enganar,em troca de alguns apanágios pessoais. Essa perspectiva egoísta e permissiva gera distorções sociopolíticas, jurídicas, culturais e religiosas em função de favorecimentos. As causas do veneno que corrói a existência da gratuidade merecem ser estudadas. Impressiona o domínio do egocentrismo contemporâneo. As relações são orientadas e estabelecidas, a partir do jogo de interesses. O vil metal tornou-se centro e motivação de quase tudo. Difere completamente daquilo que ensina o Evangelho: “Quando deres uma festa, convida os pobres, paralíticos e cegos. Então serás feliz! Porque eles não poderão te retribuir.” (Lc 14,13-14). Circunstâncias, situações e pessoas são reduzidas a meros instrumentos para alcançar o que se deseja. É o reinado do utilitarismo.
Um exemplo dessa situação é o comportamento de alguns filhos, que não cuidam dos pais idosos ou dependentes. Onde estão o reconhecimento e a retribuição a quem sempre lhes dedicou atenção e carinho?A falta de amizades generosas impossibilita palavras de ânimo e comunhão, tão necessárias aos relacionamentos. Sem a gratuidade não se logra o essencial nos vínculos fraternos. Assim, as atitudes deixam de ser norteadas pelos princípios da fidelidade e generosidade.
A ausência de gestos gratuitos configura-se igualmente na relação do homem com o meio ambiente e a Casa Comum. Os resultados são reações, por vezes,surpreendentes da própria natureza. Esta é comprovadamente pródiga, mas espera que os homens reconheçam sua capacidade de doar. Um exemplo desolador desse desrespeito é o setor da mineração, que se coloca no horizonte hermético da lógica do lucro e da idolatria do dinheiro. Esse tipo de empreendimento, realizado de modo irresponsável, acarreta um retorno deletério, provocando tragédias ecológicas e humanas, miséria para tantos e enriquecimento para poucos.
Sem o sentido da gratuidade não adianta os “bolsos cheios” de alguns,em detrimento da penúria de vários.Ela é exigência na pauta das aprendizagens necessárias à construção de um novo tempo. Nesse horizonte educativo, urge, pois, recorrer a Jesus e seus ensinamentos. Estes apresentam dinâmicas que podem levar mentes e corações à descoberta de riquezas espirituais impensáveis. Nelas está o remédio eficaz contra as doenças da humanidade.Sábias e oportunas são as palavras do apóstolo Paulo: “Em tudo vos mostrei que se deve ajudar aos fracos, recordando sempre as palavras do Senhor: ‘Há muito mais felicidade em dar do que em receber’.” (At 20, 35).