Gratuidade e generosidade

Padre João Medeiros Filho

Cristo, antes de enviar os apóstolos para pregar o Evangelho, fez a seguinte recomendação: “De graça recebestes, de graça deveis dar.” (Mt 10, 8). Eis uma exortação com força interpelativa. A gratuidade é uma virtude essencial, apesar de muitos considerarem desnecessáriaa sua inclusão nos protocolos de providências e sugestões para o mundo de hoje. Tem provocado questionamentos daqueles que calculam valores e resultados,somente a partir de dividendos e lucros. Há os que pensam prioritariamente em ampliar a lista de seus bens e benesses. Reconhecer a importância dessa qualidade humana parece algo distante das instâncias dos poderes, marcadas pela cultura do “toma lá, dá cá”.  O agir gratuito geralmente é considerado um tema secundário, quando se pensa em soluções urgentes para a sociedade hodierna. A lógica da atualidade é tirar proveito de tudo. Ninguém faz nada de graça, sem segundas intenções. A ausência de atos generosos e desinteressados dificulta sobremaneira o surgimento de uma nova era para a humanidade.

A crescente disseminação de notícias falsas manifesta os propósitos velados dos indivíduos e grupos.São mentiras elaboradas e propagadas em larga escala para fragilizar instituições, desmoralizar e destruir pessoas, incitar o ódio e, assim, de modo antiético, obter alguma vantagem. Projetos sobre novos tempos a serem vividos pela sociedade – capazes de livrá-la do caos – reservam um ínfimo espaço ao tema da gratuidade. No entanto, ela é determinante. Contém a força recuperadora do altruísmo, que ilumina olhares e fecunda a inteligência, levando a repensar os caminhos da humanidade.

Embora importante, a generosidade vem desaparecendo do cotidiano. Deixou de ser fermento no coração humano. Chega-se ao ponto de pensar que é sinônimo de ingenuidade. Equivocadamente, passa-se a considerar como “virtude” saber manipular ou enganar,em troca de alguns apanágios pessoais. Essa perspectiva egoísta e permissiva gera distorções sociopolíticas, jurídicas, culturais e religiosas em função de favorecimentos. As causas do veneno que corrói a existência da gratuidade merecem ser estudadas. Impressiona o domínio do egocentrismo contemporâneo. As relações são orientadas e estabelecidas, a partir do jogo de interesses. O vil metal tornou-se centro e motivação de quase tudo. Difere completamente daquilo que ensina o Evangelho: “Quando deres uma festa, convida os pobres, paralíticos e cegos. Então serás feliz! Porque eles não poderão te retribuir.” (Lc 14,13-14). Circunstâncias, situações e pessoas são reduzidas a meros instrumentos para alcançar o que se deseja. É o reinado do utilitarismo.

Um exemplo dessa situação é o comportamento de alguns filhos, que não cuidam dos pais idosos ou dependentes. Onde estão o reconhecimento e a retribuição a quem sempre lhes dedicou atenção e carinho?A falta de amizades generosas impossibilita palavras de ânimo e comunhão, tão necessárias aos relacionamentos. Sem a gratuidade não se logra o essencial nos vínculos fraternos. Assim, as atitudes deixam de ser norteadas pelos princípios da fidelidade e generosidade.

A ausência de gestos gratuitos configura-se igualmente na relação do homem com o meio ambiente e a Casa Comum. Os resultados são reações, por vezes,surpreendentes da própria natureza. Esta é comprovadamente pródiga, mas espera que os homens reconheçam sua capacidade de doar.  Um exemplo desolador desse desrespeito é o setor da mineração, que se coloca no horizonte hermético da lógica do lucro e da idolatria do dinheiro. Esse tipo de empreendimento, realizado de modo irresponsável, acarreta um retorno deletério, provocando tragédias ecológicas e humanas, miséria para tantos e enriquecimento para poucos.

Sem o sentido da gratuidade não adianta os “bolsos cheios” de alguns,em detrimento da penúria de vários.Ela é exigência na pauta das aprendizagens necessárias à construção de um novo tempo. Nesse horizonte educativo, urge, pois, recorrer a Jesus e seus ensinamentos. Estes apresentam dinâmicas que podem levar mentes e corações à descoberta de riquezas espirituais impensáveis. Nelas está o remédio eficaz contra as doenças da humanidade.Sábias e oportunas são as palavras do apóstolo Paulo: “Em tudo vos mostrei que se deve ajudar aos fracos, recordando sempre as palavras do Senhor: ‘Há muito mais felicidade em dar do que em receber’.” (At 20, 35).

Obedis Damásio comandará “A Voz da Esperança” na Liberdade FM

 

O publicitário caicoense Obedis Damásio comandará o programa “A Voz da Esperança”, na Liberdade FM (Parnamirim), às sextas-feiras, das 17 às 18 horas, com entrevistas, testemunhos, estudos bíblicos, louvores e com leitura da palavra de Deus.

Obedis, que também atua como assessor na área de marketing político, é testemunho vivo do poder de Deus. Depois de passar quase vinte anos entregue às drogas, ele conseguiu se libertar da dependência e, desde então, usa sua experiência em ações de solidariedade e ajuda ao próximo. Além disso, promove o Seminário de Marketing Político da Grande Natal, evento que terá sua 7ª edição no dia 10 de setembro de 2020, tornando-se uma referência no segmento em território potiguar.

“A Voz da Esperança” chega para agregar valor à grade de programação da Liberdade FM, emissora que a cada dia cresce em audiência, podendo ser ouvida pelo aplicativo Rádios Net e vista pelo Facebook e YouTube. A estreia será no dia 21 de agosto.

 

 

 

Ética para as redes sociais

Padre João Medeiros Filho

Nestas últimas décadas, a inteligência humana alcançou muitas conquistas tecnológicas – especialmente no setor das comunicações – até pouco tempo inimagináveis. Inegavelmente, o uso correto da mídia poderá prestar relevantes serviços à sociedade, pois consegue rápida difusão do conhecimento humano e maior aproximação dos indivíduos. Empresas especializadas oferecem ferramentas e aplicativos cada vez mais fascinantes, colocando à disposição do público diversos serviços gratuitos. No entanto, tais entidades registram informações reservadas dos inscritos: identidade, profissão, endereço, grau de instrução, localização, tendências sociais, ideológicas e religiosas, ou seja, traçando o perfil dos cadastrados.Não se sabe o alcance da segurança e do sigilo dos dados privativos e qual o seu destino. Ainda não se tem ideia clara das consequências de sua utilização. A experiência vem mostrando que, se não forem empregadas adequadamente,essas tecnologias contribuirão para a vulnerabilidade das pessoas. Já se percebem: desgaste das relações individuais, manipulação de dados e dificuldade para se conhecer a verdade.

Apresentam-se três questionamentos ou desafios, a partir de tais descobertas. O primeiro diz respeito às relações pessoais. Estas, apesar dos limites e desvantagens da mídia, poderão ser favorecidas por ela. O contato físico (abraço, aperto de mão, olhar…) é essencial. E quem já não teve aborrecimentos e amizades estremecidas ou até desfeitas, em virtude de postagens ou compartilhamento nas redes? É quase impossível controlar o que foi divulgado.

Outro desafio, não menos sério, é representado pela manipulação das notícias. Facilmente, usuários dos meios digitais sentem-se privilegiados em decorrência do acesso imediato a informações. Há os que distorcemos fatos e difundem inverdades e ódio. Inexiste ética. É necessário orientar na formação da consciência dos cidadãos, insistir na importância de desenvolver o verdadeiro espírito crítico em função do bem comum.Assim adverte a Sagrada Escritura: “Os lábios do justo sabem o que agrada, mas a boca dos ímpios anda cheia de perversidades.”(Pr 10, 32). Diariamente, verificam-se calúnias e difamações lançadas nas redes.Não é fácil limpar a reputação de alguém, quando ela foi conspurcada. É conhecida a metáfora sobre a detração e maledicência, comparadas a um saco de plumas jogadas ao vento, do alto de um monte. Mesmo conseguindo-se a prova da inocência, o dano foi causado. E se acontecer do erro ser reparado, as cicatrizes permanecerão, ao longo do tempo.Eis o que diz o Senhor: “Não habitará na minha casa o arrogante,nem o caluniador permanecerá na minha presença.” (Sl 101/100, 7).

Um terceiro questionamento decorre dos anteriores. É cada vez mais difícil comprovar a verdade. Há um campo aberto a informações falsas e expressões de ódio, misturadas a sofismas,inexatidões e dolos. Como distinguir o joio do trigo? Como não perder de vista a verdade, esse bem precioso à vida humana? O apóstolo Paulo recomendava: “Abandonem a ira, indignação, maldade, maledicência e linguagem indecente. Não mintam uns para os outros” (Col 3, 8-9). Na década de 1960 – antes do surgimento, no Brasil, das novas comunidades cristãs de vida e aliança – cantava-se muito um hino da autoria de Irmã Irene Gomes: “Palavra não foi feita para dividir ninguém… semear a dúvida, a tristeza e o mal-estar. O destino da palavra é a construção de um mundo mais feliz e mais irmão”.

O universo digital necessita ser ético. É indispensável a convicção de que os direitos não são ilimitados eo próximo deve ser respeitado.Urge que o bem comum esteja acima de interesses individuais e partidários.Agindo assim, as redes sociais poderão se transformar em espaços de amizade e comunhão, nos quais a justiça será respeitada e o amor vivido. Infelizmente, as recentes tecnologias comunicacionais têm se prestado, não raro,a discórdias, desavenças e rupturas. Tenta-se, por meio de alteração na legislação ou sentenças judiciais, coibir a disseminação de notícias inverídicas. Evidentemente, isso impedirá certos abusos, mas não modificará a consciência de muitos. A esse respeito, as igrejas têm uma grande responsabilidade por seus fiéis. Há de se enfatizar o sentido e a dimensão do oitavo mandamento do Decálogo e reiterar o preceito bíblico: “Preserva a tua língua do mal e os teus lábios para que não falem mentiras.” (Sl 34/33, 14).

O demônio do ódio

Padre João Medeiros Filho

Cristo deu aos apóstolos “poder e autoridade para expulsar toda espécie de demônios.” (Lc 9, 1). Na Sagrada Escritura encontram-se os termos: demônio (daimon), significando espírito mau e diabo (diábolos), representando o que divide o ser humano, não necessariamente o anjo decaído. Santo Anselmo de Cantuária dizia: “Há muitos diabinhos escondidos dentro de nós.” E um deles é o ódio, sentimento intenso de aversão, rancor, execração etc. É concretizado em atos de ojeriza ou repulsa contra alguém ou algo. Nele há sempre um desejo oculto ou patente de afastar e destruir. O desdém e o desprezo são também formas de sua manifestação. A lei de talião, contida no Código de Hamurabi, caminhava nessa direção: “Olho por olho, dente por dente.” (Mt 5, 38).

O ensinamento do Senhor é o oposto: “Amai os que vos odeiam.” (Mt 5, 44). No catecismo católico o ódio é um pecado capital, ou seja, cabeça de outros males, atraindo mais “diabos” para cada um de nós. “Legião era seu nome, pois eram muitos” (Mc 5, 9). Jesus veio anunciar o amor, princípio de unidade e antídoto do ódio. “Amai-vos uns aos outros” (Jo 13, 34). O cristianismo é a religião do amor. Aliás, a definição de Deus, encontrada no Novo Testamento, é: “Deus caritas est” (1Jo 4, 16), título e objeto de uma encíclica do Papa Bento XVI, promulgada em 2005.
Teólogos e exegetas analisam as consequências do ódio, que causa divisões, cega e violenta os seres humanos. Segundo São Boaventura, é como “uma planta daninha que corrói a alma de quem o guarda dentro do coração.” Muitos reconhecem a beleza do poema atribuído a São Francisco de Assis: “Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor”. Associado à inveja, causou o primeiro homicídio registrado na Sagrada Escritura, materializado no assassinato de Abel (cf. Gn 4, 8). Odiar é não saber conviver e respeitar as diferenças e divergências. Está na origem da imposição, do totalitarismo e da violência.

O Livro do Gênesis relata que o homem foi plasmado à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn 1, 27). Este, em sua essência, é comunidade, diversidade, isto é, em termos dogmáticos, Trindade. O radicalismo e a intolerância são negações de nossas raízes divinas. Quando aluno da Universidade de Louvain (Bélgica), causava-me admiração a multiplicidade de etnias e crenças do alunado. O Reitor, Monsenhor Albert Descamps, agradeceu numa missa a presença de discentes de mais de cinquenta nacionalidades. Pertenciam a diversas culturas e religiões, vivendo em harmonia e espírito ecumênico, buscando a riqueza do saber. Outrossim, aquela autoridade acadêmica lamentava que seus compatriotas se desentendessem por conta de um problema linguístico. “Nada é perfeito no país dos homens,” dizia Exupéry.

Além de uma vacina contra o Sars-Cov-2, o Brasil necessita de um antídoto contra o ódio. É hora de apelar aos filósofos, psicólogos, teólogos, pastores etc. para que desenvolvam urgentemente métodos eficazes contra essa insanidade humana, que grassa atualmente pela nossa pátria. O país está sendo corroído pela intransigência. O radicalismo é de alta periculosidade, como as pandemias. Na política de hoje, não há adversários, mas inimigos, que buscam destruir o opositor. Não basta divergir, há que exterminá-lo.

Há anos, presenciei Dinarte Mariz e Walfredo Gurgel, em torno da mesma mesa, dividindo o pão e as ideias. Ambos, durante anos, militaram politicamente em fronteiras opostas. Era saudável vê-los discutindo civilizadamente. Convivi de perto com o saudoso monsenhor e nunca o ouvi pronunciar algo que desabonasse o senador. E este sempre se referia ao sacerdote como um homem de bem, culto, íntegro e digno. Isto faz lembrar o salmista: “Vede como é bom e agradável os irmãos viverem juntos!” (Sl 133/132, 1). Cristo profeticamente rezou por seus discípulos: “Pai, que todos sejam um como Eu e Tu” (Jo 17, 21). O ódio poderá ser debelado pelo perdão, amor e humildade. “Vale muito mais um prato de legumes com amor do que um boi gordo inteiro, regado a ódio!” (Pr 15, 17).

 

Jornal alemão informa que o ex-papa Bento XVI está gravemente doente

O ex-papa Bento XVI está gravemente doente depois de retornar ao Vaticano de uma visita à Alemanha, disse hoje (3) o jornal alemão Passauer Neuer Presse, citando o biógrafo do ex-pontífice.

Bento XVI, de 93 anos, está bastante frágil e sua voz é praticamente inaudível, disse o autor Peter Seewald ao jornal.

Mas em um encontro com Seewald no sábado, o ex-papa pareceu otimista e disse que poderia voltar a escrever se recuperar as forças, afirmou a reportagem do jornal.

O ex-papa viajou para a Baviera, onde nasceu, em junho para fazer uma visita final a seu irmão doente Georg Ratzinger, que tinha 96 anos e morreu pouco depois.

Foi a primeira viagem do ex-papa para fora da Itália desde 2013, o ano que ele renunciou ao pontificado.

Fonte: Agência Brasil

“Não terás outros deuses”

Padre João Medeiros Filho

O escritor e teólogo Rubem Alves afirmou: “Aquele que se embriaga da esperança fica grávido do futuro, da eternidade e de Deus.” Talvez seja essa a virtude que nos falte, especialmente nestes tempos de perplexidade. Segundo os poetas, ela assemelha-se às estrelas, que cintilam, à noite. Os que caminham na escuridão podem vê-las melhor. Mário Quintana, inspiradamente, dissera: “Que tristes seriam nossos caminhos se não fosse o brilho das estrelas, arautos da esperança e anunciantes da paz de um novo dia.”Esperar não é cruzar os braços, mas tentar descobrir estradas e fortalecer os ânimos. Em Isaías, o profeta messiânico, pode-se encontrar: “Aqueles que andam nas trevas verão novamente o raiar do dia e o brilho da luz.” (Is 9, 2). Assim profetizou sobre o Messias prometido, queria exclamar: “Eu sou a luz do mundo.” (Jo 8, 12).

A abertura ao transcendente poderá nos tornar esperançosos e alegres. Talvez, nos dias atuais, tenha sido insuficiente naqueles que têm fé. As religiões devem ser mensageiras da alegria e afastar o medo, pois Deus é Vida e Paz. Recentemente, estivemos numa clínica médica. Como sói acontecer, chegamos antes da hora aprazada. Nas antessalas dos consultórios, preferimos escutar mais. Já havia ali alguns pacientes. Um rapaz comentou: “Estou doido que passe essa pandemia para poder frequentar os barzinhos, as festas, badalar etc.” Uma senhora referiu-se à quarentena (que já passou de centena): “Assim que tudo terminar, eu irei pagar uma promessa.” A atendente também manifestou o seu desejo: “Estou orando para que essa doença acabe. Quero retornar à faculdade para colar grau brevemente.”Uma jovem expressou a sua vontade: “Tomara que tudo passe. Estou doente de tanto ficar trancada em casa. Sinto saudades dos shoppings. Preciso ver as novidades.

Evidentemente,tais relatos,expressando temperamentos e posturas diferentes, prestar-se-iam a análises mais acuradas. Uns pensam no “carpe diem”, do poeta latino Horácio. Mas, o apóstolo Paulo reiterou: “Tudo me é permitido, mas não deixarei que nada me escravize.” (1Cor 6, 12). O isolamento social forçado talvez não nos tenha retirado ainda o véu do egoísmo e materialismo. A inquietude que vivemos e a apreensão que nos domina não se manifestaram emissárias eloquentes do Eterno. É preciso cuidado para que a ruptura da barreira do confinamento não conduza ao exagero. A repressão pode eclodir numa onda frenética da busca de prazer, consumo e saciedade material. Muitos poderão ir proustianamente “em busca do tempo perdido”. O penúltimo fim de semana, especialmente nas praias, pode ter sido um indício de outra pandemia. Não a do invisível e temido vírus chinês, mas a da morbidade do vazio. Um médico potiguar, em entrevista à mídia tradicional, afirmou que “a saúde implica no bem-estar biológico, social e mental.” A sede existencial de muitos é um alerta, que exprime a escassez do sagrado. Talvez, os líderes religiosos não tenham ainda valorizado devidamente essa realidade.

Há uma lentidão nos processos de mudanças civilizatórias, apesar de urgentes e indispensáveis ao Brasil. Contribui para tal inércia a pressão de segmentos da sociedade que não enxergam nada, além da lógica do dinheiro. Colocam-se na contramão de um humanismo capaz de superar os atuais desafios. A tarefa educativa para se cultivar novos hábitos não pode prescindir da participação de instituições sérias, dentre elas, as igrejas.O Brasil está em processo de rápida transformação. O discernimento da cultura cristã necessita ser resgatado. É preciso analisar com sabedoria as mudanças, a fim de que os caminhos sejam pertinentes à humanidade de nosso tempo. Atualmente, prevalece o culto às “divindades modernas”: vaidade, poder, glória,dinheiro, consumo,prazer etc.Em contraponto, destaca-se a criatividade de Paulo, no Areópago de Atenas, chamando a atenção para o “Deus desconhecido [Cristo]”. O apóstolo dos gentios “ficou inflamado, ao ver aquela cidade entregue à idolatria.”(At 17, 16). Pessoas pouco esclarecidas ou tíbias na fé sucumbem à tentação de novos ídolos, não raro, latentes nas ideologias. O Senhor já advertia o povo do Antigo Testamento: “Não terás outros deuses, além de mim.” (Ex 20, 3).

Templos fechados, corações abertos

Padre João Medeiros Filho

Doutor William Douglas R. Santos é professor e juiz titular da Quarta Vara Federal de Niterói. Recentemente, afirmou que as igrejas não podem ser fechadas, pois prestam serviço essencial. Comentava que as pessoas vão a supermercados e padarias – atividade vital – a fim de adquirir o alimento cotidiano indispensável para o corpo. Mas, não tiveram chance, mesmo se fossem observados todos os cuidados e precauções, de receber presencialmente o pão espiritual. De acordo com o magistrado, “é natural e cabível que as autoridades civis exijam dentro dos templos o uso de máscara, álcool gel e o distanciamento social. No entanto, não podem determinar o seu fechamento”. O medo calou e tolheu a população. Durante a perseguição de imperadores romanos e em outros momentos, pastores e fiéis foram destemidos. Entretanto, não se deve considerar o silêncio de muitos como ausência de fé ou de convicção religiosa. Várias lideranças cristãs e de outros credos optaram por não questionar medidas determinadas, De acordo com dados científicos disponíveis. Agiram deste modo para não tumultuar ainda mais a vida dos fiéis, apavorados com a pandemia. Fecharam os prédios, mas não as igrejas de nossos corações. O apóstolo Paulo afirmava: “Não sabeis que vós sois o Templo de Deus”? (1Cor 3, 16).

Em texto divulgado nas redes sociais, Chris Banescu (docente da Universidade de Maryland) demonstrou espanto ao ler que o Covid-19 é assaz inteligente. Segundo teorias propaladas, o vírus é passível de se ocultar inclusive nos bancos das igrejas. Assim declaram alguns cientistas, seguidos por certos administradores e líderes. Consoante suas pesquisas, o Sarscov-2 pode contaminar os indivíduos até dois metros (ou metro e meio) de distância. Ironicamente, Chris imagina que o vírus possua um sensor acoplado a uma trena. Conclui dizendo que,em nome da “ciência”, nos transmitiram também relatos fantasiosos e dados de ficção. “Será que não há subliminarmente outros interesses (até ideológicos)?” Assim, indagou Banescu.

Voltando ao Dr. William Douglas, este enfatiza que os templos são lugares protegidos pelos direitos humanos e pela Constituição Federal. O culto religioso constitui-se em atividade essencial à vida. Por isso, ninguém poderá impedi-lo.Ele lembrou ainda que as igrejas pertencem aos fiéis, que as mantêm e devem ser ouvidos. Na ocasião, aludiu à laicidade constitucional do Estado brasileiro e à atuação histórica de teístas no cenário político. Ser laico implica na liberdade e respeito de todas as religiões e até do ateísmo. E o Estado precisa saber lidar com as diversas crenças numa sociedade pluralista e democrática. Constitucionalmente, não se pode abolir Deus e a vida religiosa de nosso povo. Fechar as igrejas acarreta, de forma sutil e velada,a exclusão do Divino no cotidiano dos que creem. Para eles os templos são locais privilegiados da presença do Sagrado.

Há os que querem banir Deus e Cristo da arena pública. Volta à baila a discussão sobre a posição dos símbolos religiosos – máxime os cristãos – em edifícios oficiais. Tem sido objeto de um processo de apelação junto ao Supremo Tribunal Federal. Vale citar as palavras do renomado jurista Sobral Pinto: “O crucifixo nas repartições públicas e nas cortes – independentemente de haver uma religião que surgiu do Crucificado – é uma salutar advertência sobre a responsabilidade dos governantes e juízes, a respeito de erros e riscos de atenderem aos poderosos mais do que aos necessitados e desvalidos”.

À luz do Direito, deveria ter sido analisado o fato das igrejas serem fechadas,durante a pandemia.Como pastores e ministros do culto compete-nos, segundo os postulados teológicos, animar e fortalecer os fiéis na sua fé, com a pregação da Palavra Sagrada e a distribuição dos sacramentos. Santo Irineu, primeiro bispo de Lyon, afirmara: “Não é justo privar os meus irmãos da Ceia do Senhor”. Até em situações bélicas, os capelães militares (de diferentes religiões) se achegam aos campos de batalha para assistir aos feridos e moribundos. Nesta guerra sanitária, há quem questione: não fomos inibidos no exercício do ministério, privando os cristãos da vida litúrgica? “Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem” (Lc 23, 34).